O ano de 2021 vai chegando ao fim e a Auben Energia faz um balanço dos principais pontos do mercado de energia brasileiro. Um ano marcado pelo menor nível de chuvas num histórico de 9 décadas, na consequente elevação dos preços da energia, mas que por outro lado sinalizou avanços regulatórios, adoção do PLD horário e pontos polêmicos como a privatização da Eletrobras.
Confira alguns dos principais temas que foram destaques ao longo de 2021:
1 - Racionamento:
A escassez de chuvas em 2021 é considerada a pior dos últimos 91 anos e levantou muitas preocupações em meados de 2021 com a iminente possibilidade de faltar energia elétrica no país.
As entidades do setor trabalharam em conjunto para buscar uma solução para o grave problema, num momento em que os níveis dos reservatórios apresentavam valores críticos. No início de setembro, por exemplo, o subsistema SE/CO estava com apenas 21,10% de volume útil nos reservatórios e o Sul com 27,23%.
Em junho, houve a criação da Câmara de Regras Excepcionais para Gestão Hidroenergética, que determinou a produção por termelétricas e a importação de energia. Com isso, houve o aumento no custo de produção que foi repassado aos consumidores através da criação da bandeira tarifária de escassez hídrica, que adiciona à tarifa R$14,20 a cada 100 kWh consumido.
Somente em agosto, foi criada a Redução Voluntária de Demanda de Energia Elétrica – RVD, programa de racionamento destinado aos grandes consumidores, que se comprometessem em reduzir o consumo (de 20 a 35 MW por dia, em períodos de 4 a 7 horas), residências e a determinação de economia para prédios públicos. Para estimular a adesão ao racionamento, o governo previu uma compensação financeira. Porém, segundo especialistas a adesão foi baixa.
2 – Cenário Hídrico e os Custos para os Consumidores:
Dado o nível crítico dos reservatórios, medidas tiveram de ser executadas pelos agentes do setor elétrico brasileiro. Estas ações geraram um impacto financeiro que foi repassado aos consumidores cativos e livres. Para os cativos, por meio da adoção da bandeira tarifária de escassez hídrica, que desde 01/09/2021 adiciona R$ 14,20 para cada 100 kWh consumidos. Representando uma alta de 49,63% em relação à bandeira vermelha patamar 2 e um aumento de 6,78% na tarifa média da conta de luz, dos consumidores regulados. Sendo que a ANEEL prevê a vigência desta bandeira extraordinária até abril de 2022.
Para os livres, por meio do aumento dos Encargos de Serviços do Sistema que desde setembro deste ano vem alcançando altos patamares. Para novembro, a previsão foi de que os ESS alcançassem 6,4 bilhões, um crescimento de 19,18% sobre os 5,37 bilhões apurados em outubro, resultando num acréscimo de R$ 95,00/MWh. Este valor é percebido no momento de os consumidores livres e especiais realizarem o aporte de garantia financeira para o processo de liquidação junto à CCEE.
Vale ressaltar que, com o aumento das chuvas principalmente a partir de outubro, a expectativa é que o preço do PLD continue em queda, o que tem por consequência maior custo a ser arcado pelo ESS. Isto acontece, porque estamos vivendo um cenário operativo conservador, no qual os despachos termelétricos e importações de energia são mantidos, mesmo com as chuvas, pois o principal objetivo, neste momento, é a recuperação dos níveis dos reservatórios.
3 – Preços da Energia e o início do PLD horário:
O Preço de Liquidação das Diferenças – PLD, tem como principal objetivo valorar a energia no Mercado de Curto Prazo – MCP e, com isso, aproximar o modelo de precificação da energia elétrica da operação física do sistema. Desde 1º de janeiro de 2021, o PLD passou a ser definido em base horária para cada submercado.
Segundo a CCEE, comparando os 3 primeiros meses de operação do PLD horário, o valor médio reduziu nos quatros submercados, quando comparados ao mesmo período de 2020.
Ao longo de 2021, consumidores livres expostos ao PLD perceberam a mudança no cálculo de formas diferentes. Agentes que têm comportamento de consumo maior no período noturno, quando a energia é mais barata, perceberam um desconto na sua liquidação na CCCE, pois o PLD deste horário em relação ao preço médio do período diurno tende a ser menor. Já os consumidores que têm perfil de consumo maior durante o período diurno perceberam um aumento do preço da energia com o PLD horário. De dia, normalmente o preço da energia é mais elevado que a média diária. Já para os geradores, o impacto foi praticamente o inverso deste apresentado para os consumidores.
Percebe-se na Figura abaixo, que o PLD oscilou bastante ao longo do ano, tendo permanecido no seu teto ao longo dos meses de julho, agosto e setembro. A partir de outubro, vê-se uma acentuada queda que permanece até os dias presentes.
4 – Avanço na Abertura do Mercado Livre de Energia:
Ao longo do ano muito se foi discutido, seja no Congresso ou em órgãos técnicos, sobre a abertura total do mercado livre de energia. Esta proposta prevê que em breve os pequenos consumidores consigam, assim como os grandes consumidores hoje, contratar a sua energia diretamente com os geradores.
No fim da primeira quinzena de dezembro/2021, a comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou o parecer do relator sobre este tema. Como tramita em caráter conclusivo, o texto seguirá para análise do Senado, a menos que haja recurso para que o Plenário da Câmara também se pronuncie sobre a matéria. Com a medida, os pequenos consumidores poderão contratar energia de outros fornecedores, e não apenas da distribuidora à qual estão conectados. Hoje o ambiente livre é restrito aos grandes consumidores, como dito anteriormente. A migração entre os mercados se dará em até 72 meses após a entrada em vigor da lei.
Além da abertura do mercado livre, o parecer aprovado inclui outros assuntos, como regras para prorrogação da concessão de usinas hidrelétricas com potência superior a 50 MW e uma espécie de minicódigo para o autoprodutor (consumidor que recebe outorga para produzir sua própria energia no ACL), com critérios de apuração de encargos.
Pelo parecer aprovado, os consumidores residenciais vão comprar energia elétrica de agentes varejistas, que os representarão perante a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica - CCEE, entidade que centraliza todos os contratos de compra e venda de energia no país. A distribuidora se encarregará da distribuição da energia contratada e receberá um valor pelo serviço, cobrado na conta de luz. O texto permite que os agentes varejistas ofereçam a seus clientes tarifas diferenciadas por horário e serviço pré-pago (à semelhança da telefonia celular).
Para viabilizar o novo mercado, determina-se ainda a separação entre lastro e energia no setor elétrico. Nesse modelo, as usinas se comprometem a disponibilizar ao sistema elétrico determinada potência (o lastro, dado em MW), pelo qual serão remuneradas por um encargo cobrado na conta de luz de todos os consumidores, na proporção do consumo individual de energia elétrica. Adicionalmente, a energia efetivamente produzida por elas será comercializada com os consumidores à parte, na forma de MWh. Assim, as usinas terão duas fontes principais de receita: o encargo de lastro e a quantidade de energia elétrica vendida aos clientes por meio dos agentes varejistas. A separação possibilita que a energia seja comercializada como um produto sujeito a regras de mercado.
5 – Privatização da Eletrobras:
Em julho foi aprovado pela Câmara Dos Deputados o projeto que autoriza o Governo Federal a privatizar a Eletrobras. O projeto, que gerou muita discussão e, posteriormente, encontrou grande resistência no Senado Federal, onde também foi aprovado, trouxe importantes decisões na destinação dos recursos.
Alguns exemplos são: prorrogação por 30 anos das concessões das usinas de Itumbiara, Sobradinho, Mascarenhas de Moraes e Tucuruí, descotização das usinas da Eletrobras, prorrogação dos contratos do PROINFA por 20 anos, contratação de geração termelétrica movida a gás natural e a contratação nos Leilões A-5 e A-6 de no mínimo 50% da demanda declarada das distribuidoras de centrais hidrelétricas até 50 MW.
Com a autorização pelo Congresso Nacional, o Governo Federal prevê que a privatização da estatal ocorra ao longo de 2022, após o próprio Congresso analisar os vetos do Executivo ao projeto, o BNDES finalizar a modelagem da capitalização e a homologação, por parte do Tribunal de Contas da União – TCU.
6 – Marco Regulatório da GD:
O Congresso Nacional finalizou a análise e aprovação do PL 5829/19 que institui o novo marco legal da micro e minigeração distribuída no Brasil.
A Lei prevê que até 2045 os micro e minigeradores já existentes pagarão os componentes da tarifa somente sobre a diferença, se positiva, entre o consumido e o gerado e injetado na rede de distribuição, como ocorre hoje. A regra valerá ainda para consumidores que pedirem acesso à distribuidora, por meio do Sistema de Compensação de Energia Elétrica - SCEE, em até 12 meses da publicação da futura lei. Porém, a lei aprovada proíbe a participação no SCEE das centrais geradoras que já tenham:
Registro, concessão, permissão ou autorização no Ambiente de Contratação Livre - ACL ou Regulado -ACR;
Entrado em operação comercial nesses ambientes;
Tido sua energia elétrica contabilizada no âmbito da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica - CCEE; ou
Sua energia comprometida diretamente com concessionária ou permissionária de distribuição de energia elétrica no ACR.
Será proibido ainda a divisão de central geradora em unidades de menor porte para se enquadrar nos limites de potência para microgeração ou minigeração distribuída.
O texto define como microgeradores aqueles que geram até 75 kW de energia de fontes renováveis (fotovoltaica, eólica, biomassa e outros) em suas unidades consumidoras (em telhados, terrenos, condomínios, sítios); enquanto minigeradores são aqueles que geram mais de 75 kW até 5 MW. Mas há a previsão de que, a partir de 2045, esse limite passa para 3 MW nessa definição, para a fonte solar.
O projeto prevê uma transição de sete a nove anos no pagamento dos encargos de distribuição por aqueles que começarem a geração depois de 12 meses da nova lei. Esses pagamentos são relativos à remuneração dos ativos do serviço de distribuição, da depreciação dos equipamentos da rede e do custo de operação e manutenção do serviço. Assim, do custo mencionado, esses geradores pagarão, a partir de 2023, 15%, e que a cada ano será somado o percentual de 15%, chegando a 2029 com 100%. Posteriormente, novas regras serão definidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL em até 18 meses da publicação da lei e valerão a partir de 2029. Porém, para as unidades que protocolarem as solicitações de acesso entre o 13º e o 18º mês a partir da publicação da lei, essas novas regras entrarão em vigor a partir de 2031.
Para unidades de minigeração que produzem mais de 500kW para autoconsumo remoto (em local diferente da geração) ou na modalidade de geração compartilhada (reunidos em consórcio) em que um único titular detenha 25% ou mais, o participante do SCEE pagará, além disso, 40% de tarifas de uso dos sistemas de transmissão da rede básica e 100% dos encargos de fiscalização, pesquisa e desenvolvimento (TFEE e P&D).
Mesmo que um micro ou minigerador consuma muito pouco em um determinado mês, ainda pagará um valor mínimo (para minigeradores, vale a demanda contratada). Para aqueles consumidores-geradores que não estão isentos dos encargos até 2045, o texto prevê faturamento mínimo se o consumo medido for menor que o consumo mínimo faturável, desconsiderando-se as compensações. Quem tiver geradores com potência instalada de até 1,2 kW deverá ter uma redução de 50% em relação ao valor mínimo faturável dos demais consumidores equivalentes.
Quanto as bandeiras tarifárias, elas incidirão somente sobre o consumo a ser faturado, e não sobre a energia excedente usada para compensar o consumo. E há a permissão para a participação das instalações de iluminação pública no sistema de compensação, devendo a rede de um município ser considerada como uma unidade consumidora.
Comentarios